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I - ORIGENS
Os romances dos autores românticos europeus como Victor Hugo, Alexandre Dumas, Walter Scott e outros tornaram-se populares no Brasil através de sua publicação em jornais, depois de 1830, criando no público o gosto por um gênero ainda desconhecido entre nós.
Típica cena romântica Tanto na Europa quanto nas traduções brasileiras, essas narrativas eram primeiramente publicadas na imprensa, na forma de capítulos diários ou semanais, aumentando de maneira extraordinária a tiragem dos periódicos. Os leitores não escondiam seu entusiasmo pelo desenvolvimento das histórias, seduzidos pela sucessão de acontecimentos trepidantes, pelas emoções desenfreadas, pela linguagem acessível e pela ausência de qualquer abstração intelectual.
Tais romances receberam o nome de folhetins. Ao escrever um folhetim, o artista submetia-se às exigências do público leitor e dos diretores de jornais. O francês Eugène Sue chegou a ressuscitar um personagem porque os leitores não haviam se conformado com sua morte. Ou seja, o que determinava o desenvolvimento e o desfecho de uma narrativa era o gosto popular. Desta forma, ao criar um folhetim o escritor se sujeitava aos valores culturais e ideológicos do público, que desejava histórias melodramáticas e alienadas da realidade.
Por razões econômicas, quase todos os ficcionistas do período passaram a produzir primeiro para a imprensa. Mesmo alguns dos maiores novelistas do século XIX, como Dostoievski e Machado de Assis, se viram compelidos a lançar suas obras em fascículos. Todavia, eles não aceitavam a concepção folhetinesca da narrativa, mantendo sua independência estética. Outros, mais interessados na venda e na popularidade subordinavam seus textos à estrutura típica do folhetim, que é a seguinte:
Harmonia · felicidade · ordem social burguesa Desarmonia · conflito · desordem · crise da sociedade burguesa Harmonia final · reestabelecimento da felicidade · reordenação definitiva da sociedade burguesa, com o triunfo de seus valores
Com o tempo, os ficcionistas passaram a utilizar uma série de truques narrativos, repetidos até a exaustão. Exemplo disso são os conflitos mais óbvios e recorrentes, vividos pelos protagonistas, e suas soluções quase sempre idênticas:
E foram felizes · a falta de dinheiro - o pobre casa com a rica e vice-versa, movido apenas pelo amor; ou um deles recebe grande herança de parente desconhecido, etc.
· a ausência de identidade - aparecem amuletos, retratos, objetos ou sinais corporais que provam o que se deseja provar, geralmente a origem nobre ou burguesa de um plebeu.
· a inexistência de testemunhos - surgem personagens, muitas vezes vindos das sombras, que ouvem conversações secretas ou recebem confissões proibidas, e que então confirmam uma identidade perdida ou inculpam alguém por um crime cometido.
Como regra geral, no último capítulo, após intensos tormentos, maldade e desolação, os obstáculos são removidos e o amor vence. Em vários romances, contudo, a ordem social é mais forte que a paixão e os amantes acabam destruídos pelas conveniências e pelos preconceitos. De qualquer maneira, o final de um folhetim tem sempre um caráter apoteótico e desmedido, seja na felicidade, seja na dor.
II - O SURGIMENTO NO BRASIL
A jovem e a luta contra a paixão física O sucesso do folhetim europeu, em jornais brasileiros, foi resultado da emergência de um novo público leitor, composto basicamente por estudantes e mulheres. Era um público urbano, mas não raro procedente do campo: em geral, filhos e esposas de senhores rurais que haviam se estabelecido na Corte, depois da Independência.
As mensagens sentimentais libertadoras dos folhetins serviram como uma luva às necessidades daquela gente asfixiada pelas regras intolerantes de uma sociedade economicamente agrária e culturalmente arcaica. E isso estimulou o aparecimento de vulgares adaptações dos relatos românticos, feitas por escritores de segunda categoria. Teixeira e Sousa, em 1843, publicou O filho do pescador, tornando-se o pioneiro desse subgênero.
No entanto, em 1844, veio à luz A moreninha, de Joaquim Manuel de Macedo. Pelo enredo melhor articulado, pelo registro do ambiente carioca e pela sutil harmonização entre amor juvenil e preceitos conservadores, esta narrativa ultrapassava a dimensão de simples cópia de folhetins europeus. Sob certos aspectos, estava nascendo o romance brasileiro.
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